segunda-feira, 29 de junho de 2015

O homem de linho branco e panamá

Impecável, o homem de linho branco e panamá dobrou a esquina e subiu a rua pedregosa. Não digo que cambaleasse por causa das pedras, nem é certo que levasse na mão esquerda uma garrafa de cachaça: os de Santa Cruz sabiam seu jeito de andar. Mole e desajeitado, não surpreendia que levasse tanto tempo até a capelinha, no alto do morro. Uma fazenda e meia de pedras e pronto, era lá. Mas esses poucos metros, quanto mais subia, mais custava ganhar. Não digo que fosse pesado, nem é certo que fosse já velho: os de Santa Cruz ignoravam sua idade e seu nome. Mas viam-no, todas as tardes, dobrar a mesma esquina e subir a mesma rua pedregosa. Que um homem jovem exagere na boemia e volte tarde pra casa, que um bêbado contumaz refaça o círculo de seu vício dia após dia sem mudança de roteiro, tudo é coisa que se entende e se espera. O que não se espera nem se entende é que, sem beber nem fumar, sem ser gordo nem magro, nem velho nem moço, um homem ponha-se cotidiano, precisamente no mesmo horário - o das novelas vespertinas - a subir a mesma rua pedregosa, em direção à mesma igreja, sem que nunca lá chegue. Quem o visse de longe, quem estivesse em nosso barraco, no morro de cá, veria o que vejo: impecável, um homem de linho branco e panamá, as pernas em movimento, como que disjuntas, a subir eternamente, em procissão solitária, pela rua pedregosa das tardes sem saída.

Luis Gustavo

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