quarta-feira, 27 de abril de 2016

Os circuitos de consagração social serão tanto mais eficazes quanto maior a distância social
do objeto consagrado.

BOURDIEU

domingo, 24 de abril de 2016

Nas primeiras noites de outono

Com uma lua assim tão alta e clara
a cujo halo se achegam os planetas
Vênus, Marte, Saturno;
com um vazio assim noturno
há pelas ruas uma porção de significantes
sonoros, ruídos, miados,
jamais significados.

segunda-feira, 18 de abril de 2016

A borboleta, um conto infantil

- Mamãe, mamãe! Tem uma borboleta no chão do banheiro. É gigante, mamãe!

- Sei. Escova os dentes e vai já pra cama.

- Mamãe, mamãe! Eu mexo nela, mas ela não quer sair. O chão está molhado, acho que alguém pode pisar, empurrei um pouquinho aquele tapetinho debaixo do chuveiro, ela bateu as asas, mas não quis sair.

- Escova já esses dentes, menino!

Pedrinho entrou outra vez no banheiro e, cuidadoso, foi empurrando o tapete de banho em direção à borboleta, para que ela subisse, afinal. Teve medo: não é que fosse grande, mas tinha um corpo do tamanho de suas mãozinhas.

O chão estava molhado e era preciso, de algum jeito, tirá-la dali: se o pai ligasse o chuveiro, não a veria e pode muito que pisasse nela.

- Ai, mamãezinha! Ela bate as asas, mas não voa! - gritava do banheiro, de onde escutava apenas a própria voz.

A borboleta, como se ouvisse seus apelos, que mais pareciam gemidinhos, colocou as patinhas, uma atrás da outra, sobre o canto do tapetinho de plástico. Repousou as asas sobre o corpo e ali ficou.

Maravilhado com a manobra, Pedrinho passou um minuto inteiro olhando a borboleta, em uma quase veneração. De pouco em pouco, curvou o tapetinho de banho, de um jeito que não assustasse a borboleta. Era preciso o quanto antes movê-lo do chão, sem perturbá-la.

- Já peguei, mamãe. Está aqui!, disse extasiado, agora quase sussurrando, enquanto saía do banheiro e entrava na sala. A mãe, porém, continuava a mexer no celular, indiferente.

Pedrinho foi à janela da sala: era dali que se via a paisagem mais bonita. E sempre bate um ventinho, pode ser que ela goste, pensou. E agora ela voaria, sem bater na parede, sem ficar presa aos móveis e coisas da casa.

Enquanto arrumava os braços para fora da janela esperava, serenamente, por algum sinal de vento. Observava a respiração fraca, mas constante, da borboleta: era como a sua. 

O vento veio, afinal. - É agora, borboleta, disse.

Com a mãozinha esquerda segurava o tapetinho. Com a direita, carinhosamente empurrou o animalzinho para fora do tapete e, sem mais, ela estava solta. Mas o vento calou e a borboleta parou no ar, por um segundo.

E se estatelou no chão como uma pedra.

domingo, 3 de abril de 2016

- Não sei, mas às vezes sinto que preciso de uma injeção...
- De quê?
- Oi?
- Injeção de quê? Que remédio, que droga?
- Não sei. Mas é quase uma certeza.