segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Carta para Basta

Faz tempo não lhe escrevo, Basta. De longe todo tipo de besteira é motivo pra eu me lembrar de você. Outro dia o taxista fez uma curva fechada, procurei o puta-que-pariu e nada: lembrei de você. Quando Errol Garner começou a tocar "My funny Valentine" numa gravação de 63 no canal Curta!: lembrei de você. Dizem que o amor acabou. Outra vez em outra cidade, percebo que é costume do amor correr o meio-fio e entrar pela boca de lobo mais perto de casa. Da saída de incêndio do edifício vejo os travecos, nossos novos malandros, de navalha em punho: assaltando o coração de outro macho. Recordo aquele nosso amigo que se dizia "malandro", o rei da brasilidade. Um dia ele chamou de "tambores de Angola" o som que vinha vizinho do nosso campus. Que nada, eram só as nossas pretas preparando o rango da moçada. Vestido de algodão sobre o jeans desbotado e um canto rouco, rouco de tanto trabalho. Recordei também o cretino que veio nos encher o saco durante uma festa da faculdade, falando em Scott Fitzgerald. Recordei então todos os cretinos, anotados e não anotados em nosso caderninho, e tive uma saudade imensa de você. De pouco em pouco vou esquecendo o lirismo. Acredito mesmo que esqueci como se escrevem aquelas coisas todas. Mas ainda acredito que a palavra amor seja apenas um anagrama, um anatema para tantos outros buracos de lobo por onde invariavelmente corremos, seguindo o meio-fio. Basta, você faz muita falta: seus olhos bastos de tão mansos e uma cadeira vazia.

Luis Gustavo