terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

A VITÓRIA DA IMAGEM SOBRE O CONCEITO


No confuso mercado de palavras a imagem venceu. A teoria, em quem depositamos alguma esperança, virou lugar de vaidade e não de reflexão. Nas vitrines foram erigidas as leituras de uma pretensa pós-modernidade, de uma suposta psiquê humana e do fim da (já abatida) razão. Na lente-padrão distribuída em nossa literatura de farmácia a arte, o pensamento livre e a militância foram reduzidos à condição de mercadoria. Hoje militam a favor da corrente e não contra ela, como era usado quando, afinal, "militar" ganhou sentido de radicalização e mudança. E o capital social, como alavanca dos arrivistas e consolo dos desolados, perdeu ares de nobreza sem tornar-se, por isso, melhor. O grito das periferias e dos subúrbios foi tragado pelo equa(igua)lizador do showbusiness e os critérios de eleição da obra de arte foram dispensados por um insidioso reclame de democratização da cultura e atualização dos ouvidos. A cultura foi reduzida à sociedade e a sociedade à cultura. Os debates, que sempre têm um centro de irradiação e outros tantos de recepção, foram desmentidos por intelectuais covardes e pseudointelectuais valentes. Os lugares de diálogo viraram palco de monólogo e onde deveria haver esforço de construção há precarização, pressa e medo. O enfrentamento da vida deu lugar a uma cultura boba e idiota da "positividade" e da "good vibe". Todos são cheffs, coaches, líderes, enólogos. As leituras de fôlego, as críticas mordazes e a regulação de expectativas cognitivas, quando o papo é estética, tecnologia e ciência, deram lugar a uma precária e cabotina cultura da diversidade. Diversidade que, em vez de alavancar reformas estruturais e projetar todas as identidades no mapa social, responde antes ao anseio do próprio neoliberalismo e de uma mesquinha, perversa e triste imagem de sociedade justa. De todas as imagens, de todas que há no mundo, ainda fico com a de Estamira.



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