quarta-feira, 27 de maio de 2015
CANTILENA PARA UM SONO BOM
Para o professor Rondon Rodrigues Ferreira
Na verdade, ficou muito bom o seu desenho. Só lhe escapou o riso que, não sei bem, é algo que está na cabeça de quem o conheceu. Talvez a mesma coisa se tivesse passado com a Monalisa, de Leonardo. Não podendo reproduzir o riso da memória do mensageiro, e nem de outro retrato que lhe servisse, o riso ficou por isso mesmo. Dizem que o risível está na altura do chão. É algo que coça, e se chega por baixo do humor. Você sabe, não é do humor baixo. Mas daquele bom, do atrabiliário, antigo, humor fino feito papo-de-anjo. Mas vamos lá, que é hora de dormir. E toda noite a gente dorme com o riso que pode ter.
Luis Gustavo
segunda-feira, 25 de maio de 2015
O HOMEM SIMPLÓRIO
A simplicidade, essa solteirona risonha e corada que se encontra em qualquer canto do Brasil, tornou-se uma espécie de reguladora dos padrões morais camponeses que se meteram, desde cedo, em nossas cidades. A mudança de valores rurais para o meio urbano trouxe, na sacola do caipira, uma modalidade curiosa do que ele chama de "humildade". Estou falando no caipira mas, é óbvio, poderíamos tratar assim de muitos camponeses. É o que acontece com personagens como FIÓDOR PAVLÓVITCH KARAMÁZOV, de DOSTOIÉVSKI. A "humildade" camponesa é motivo de orgulho, o que pode soar um contrassenso. Mas é assim mesmo: o homem simplório e humilde tem orgulho de sê-lo, a escola da vida lhe deu a lição e, se por acaso topa com alguém que detém detalhes mais acurados sobre determinado assunto, tirados, além da experiência, do esforço lógico sistemático, seu orgulho pode ser facilmente ferido. E então retruca: ora, mas resumindo é isto que você quer dizer..., sem atinar que, certas coisas, se resumidas na forma, são reduzidas no conteúdo. Como ocorre com o velho KARAMÁZOV, o nosso homem tem orgulho de ser, mais do que simples, simplório. Mas há nele, sim, uma complexidade, talhada tosca em madeira antiga, uma complexidade humana difícil de apreender e que só pode ser mesmo objeto de um grande escultor e de uma grande literatura: o pendor para ofender-se. O homem que se ofende fácil demais é porque é orgulhoso demais, simplório demais e difícil demais: mais difícil, mais simplório e mais orgulhoso do que ele próprio imagina.
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